sábado, 13 de abril de 2013

Cara Amélia,

Escrevo-te por não aguentar mais sozinho o meu próprio corpo que não te tem. Porque a vida tornou-se mais amarga ainda desde que me deixou e levou embora sua doce essência de fim de tarde. Escrevo-te porque há treze meses vivo procurando teu sorriso na cidade, e não encontro nem tuas lágrimas. Porque por mais que eu ainda te queira tanto, espero pelo menos poder te ver sorrindo com um outro alguém que não eu. Porque fiquei congelado no ano de 1996, quando te vi séria e decidida a completar aquela volta na pista de corrida. Quando te observei atentamente quase conseguir e tropeçar e cair. Quando te ajudei a levantar e você me disse que nunca mais iria correr. E que nunca mais correu mesmo, pois descobriu que sabia mesmo era nadar. Fiquei congelado nesses dois anos que agora me parecem ter sido tão ligeiros. Tão ligeiros e tão cheios de gosto. Da tua boca, da tua pele, dos teus olhos e da água salgada que derramou quando disse que não me amava. E que mesmo assim iria ficar, porque no fundo sabia que aquela apenas ternura, quem sabe, tornaria-se então um amor.
Escrevo-te simplesmente porque sinto tua falta e porque me mato toda vez que me lembro da certeza da tua não-volta. Escrevo-te simplesmente porque eu achava que aos poucos tua imagem se transformaria em um borrão, e que iria se distanciando cada vez mais, até que não a pudesse mais enxergar nitidamente. Escrevo-te pois achei errado. Do teu rosto, teus contornos me estão tão próximos que quase os toco, se não fossem miragem; do teu corpo lembro de cada detalhe: dos joelhos marcados, dos ombros pouco mais largos e do seio firme, da cintura que minhas mãos tanto amavam se deslizar. E o cabelo, ah, aqueles caracóis alaranjados, aquele corte mal cortado na nuca que você odiava, e eu ainda tanto adoro.
Escrevo-te enfim por não gostar mais da ideia de ter de te escrever uma carta pedindo para voltar para casa. Por não gostar de te tratar por “cara Amélia” ou só por teu nome e mais nada. Eu queria mesmo era te chamar de “minha querida”, só “querida”, só “minha”. Minha. Escrevo-te por, embora não ter chorado quase nada, tenho muita vontade de transbordar um rio por você. Escrevo-te enfim porque tua ternura por mim nunca se tornou amor, mas para mim, só ela bastaria, se assim você pudesse voltar. Escrevo para te dizer que eu, sinceramente, profundamente, te amei. E amo também. E amarei ainda por mais tempo, se o meu corpo assim permitir. Porque, não sei se já sabe, ou se está começando a perceber, estou meio insano. E que prova melhor desta não-lucidez que esta carta de amor? Minha querida Amélia, estou delirando e escrevendo, escrevendo e delirando, na esperança, num pingo de esperança que seja, que isto te traga para mim outra vez. E eu escreveria mais e mais, mas você poderia me achar louco demais, e se assustar. Se é que já não se assustou.
Amélia, te peço, me encontre naquele lindo lugar que conhecemos um dia, você sabe qual é. Te peço, me encontre lá em um dia destes no final de uma tarde qualquer, pois estarei lá. E lá esperarei. Nem que seja apenas para me deixar mais uma vez, nem que seja para se despedir. Só preciso de te ver e talvez assim entender…
Com amor,
(uma das flores que você colheu pelo caminho)

Ana Flávia Carneiro

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